Vanilce Fiel

sábado, 29 de janeiro de 2011

COMO SE FORMOU O ANTIGO TESTAMENTO
Por: Vanilce Fiel *

A Bíblia Sagrada é uma coleção de livros que passaram pelos testes de autenticidade e autoridade, por isso, são chamados de coleção canônica, consiste em duas partes, Antigo e Novo Testamento, neste primeiro momento me restringirei em apresentar um breve estudo histórico, acerca da formação do Antigo Testamento.
Para um leitor iniciante dos estudos da Bíblia, penso que é importante partir da etimologia da palavra, para que possamos de fato garantir a compreensão desses estudos. Canôn originalmente significava "junco" ou "talo" de papiro, capim-limão ou cálamo. Pelo fato dos juncos serem usados como réguas ou instrumentos para fazer linhas retas, "canon" passou a significar "medida" ou "haste de medição".
Com relação à terminologia do Antigo Testamento, esta apresenta três variantes: para os católicos os Protocanônicos são os 39 livros do Cânon ou catálogo que foi definido pelos judeus e encerrado no 1° século d.C.; deuterocanônicos, são os livros do 2º cânon, definido pelos cristãos e encerrado no 4° século d.C, compreende-se os 7 livros que Judeus e Protestantes não aceitam. Para os protestantes: os canônicos são os livros inspirados; os apócrifos como já foi dito foram reiterados por estes, e os Pseudo-Epígrafos ou “falsos escritos” correspondentes aos apócrifos dos católicos, entre os quais temos: os Salmos de Salomão, Henoc, 3º e 4º de Esdras, Jubileus, Ascensão de Moisés, Testamento dos patriarcas, Martírio de Isaías dentre outros. Já para os Judeus a terminologia acompanha a terminologia católica porque entre os judeus, alguns aceitam todos os livros aceitos pelos católicos e outros não.
Como se formaram? Esta resposta não é muito clara, pois não dispomos do documento original. O que temos são cópias resultantes de diversas outras cópias, que se deu em um longo e complicado processo e, provavelmente por vários séculos da história dos hebreus.
Inicialmente a revelação de Deus aos hebreus era transmitida de forma oral na maioria dos casos. Mensagens como "Assim diz o Soberano Senhor" e "Ouçam a Palavra do Senhor" no Antigo Testamento, foram ditas por Isaias (1.10), Ezequiel (5.5), oralmente como receberam de Deus. Esses pronunciamentos foram passados às gerações seguintes com "Palavra do Senhor" na forma tradicional oral recebida.
Em determinado ponto, palavras adágios e discursos divinamente inspirados foram registrados e preservados pela comunidade hebraica na forma escrita. Em certas ocasiões o pronunciamento e a escrita ou registro eram quase simultâneos, como o Livro da Lei, em Êxodo 24.3-4; Josué 1.8, e o oráculo de Jeremias para o rei Joaquim em Jr 36. Em outros casos o documento da revelação divina acontecia certo tempo após o acontecimento ou a circunstância que inspirou a Palavra do Senhor.

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*Vanilce do Socorro Pinto Fiel é Graduada em Filosofia pela Universidade Federal, Professora da Rede Pública Estadual do Pará, e Graduada em Ciência da Religião pela Universidade Estadual do Pará
O cânon da Escritura formava-se, à medida que cada livro era escrito, e completou-se quando o último livro foi terminado. Quando falamos da “formação” do cânon estamos realmente falando do reconhecimento dos livros canônicos pela Igreja. Esse processo levou algum tempo. Alguns afirmam que todos os livros do Antigo Testamento já haviam sido colecionados e reconhecidos por Esdras, no quinto século a.C. Referências nos escritos de Flávio Josefo (95 d.C.) indicam a extensão do cânon do Antigo Testamento como os 39 livros que hoje aceitamos. A discussão do chamado Sínodo de Jamnia (70-100 d.C) parece ter partido deste cânon. Nosso Senhor delimitou a extensão dos livros canônicos do Antigo Testamento quando acusou os escribas de serem culpados da morte de todos os profetas que Deus enviara a Israel, de Abel a Zacarias (Lc 11.51). O relato da morte de Abel está, é claro, em Gênesis; o de Zacarias se acha em segundo Crônicas 24.20,21, que é o último livro na disposição da Bíblia hebraica (em lugar de Malaquias). Para nós, é como se Jesus tivesse dito: “Sua culpa está registrada em toda a Bíblia - de Gênesis a Malaquias”. Ele não incluiu qualquer dos livros apócrifos que já existiam em seu tempo e que continham relatos das mortes de outros mártires israelitas.
Os manuscritos originais do Antigo Testamento e suas primeiras cópias foram escritos em pergaminhos ou papiro, desde o tempo de Moisés (c. 1450 a.C.) até o tempo de Malaquias (400 a.C.). Até a sensacional descoberta dos Rolos do Mar Morto em 1947, não possuíamos cópias do Antigo Testamento anteriores a 895 d.C. Uma das razões que garante a sua confiabilidade dá-se pelo fato da veneração que os judeus tinham pelo texto sagrados e que os levava a enterrar as cópias, à medida que ficavam gastas demais para uso regular. Na verdade, os massoretas (tradicionalistas), que acrescentaram os acentos e transcreveram a vocalização entre 600 e 950 d.C., padronizando em geral o texto do Antigo Testamento, engendraram maneiras sutis de preservar a exatidão das cópias que faziam. Verificavam cada cópia cuidadosamente, contanto a letra média de cada página, livro e divisão. Alguém já disse que qualquer coisa numerável era numerada. Quando os Rolos do Mar Morto ou Manuscritos do Mar Morto foram descobertos, trouxeram a luz um texto hebraico datado do II século a.C. de todos os livros do Antigo Testamento à exceção de Ester. Essa descoberta foi extremamente importante, pois forneceu um instrumento muito mais antigo para verificarmos a exatidão do Texto Massorético, que se provou extremamente exata.
Quem eram os Massoretas?
Os Massoretas eram os escribas judeus que se dedicaram a preservar e cuidar do manejo do texto hebraico do Velho Testamento. Às vezes o termo também é empregado para o comentarista judeu do livro sagrado. Eles substituíram os escribas (Sopherins) por volta mais ou menos do ano 500 a. C e prosseguiram em seu dedicado trabalho até o ano 1.000 a. C
O hebraico, como era originalmente escrito, constava apenas de consoantes, sendo os sons vocálicos supridos pelo leitor, além das palavras serem todas unidas. Este processo obrigava o leitor a pensar e ir interpretando o texto, para descobrir-lhe o exato sentido, pois três consoantes (assim eram formadas as palavras em hebraico) com vogais diferentes, podem indicar coisas muito diversas, como ilustram as consoantes portuguesas p t t, nas palavras pateta, patota, e patote, e ainda b r d - barda, bardo, borda, bordo, etc.
A escrita das consoantes foi apenas processo de adequação enquanto o hebraico continuou sendo um idioma falado. Quando aparecia uma palavra que podia ser ambígua, eram usadas "letras vogais" para deixar o texto mais claro. Quatro consoantes fracas, algumas vezes eram usadas como vogais = álefe, hê, vau e o iode.
Quando o hebraico foi deixando de ser uma língua falada (já no tempo de Cristo não era uma língua viva) muito mais difícil ficou a pronúncia correta das consoantes sem sinais vocálicos. A pronúncia correta das palavras era transmitida pela tradição oral, mas em breve foi sentida a necessidade de ser esta representada por escrito.
O minudente e consciencioso trabalho estatístico que os massoretas realizaram é impressionante, empregando toda a técnica que é possível ao ser humano para assegurar a exata transmissão do texto. Dentre as estritas e minuciosas regras a serem seguidas na cópia dos manuscritos, uma era a seguinte: nenhuma palavra ou letra devia ser escrita de memória. Antes de iniciarem propriamente a cópia, eles contavam os versos, as palavras e letras de cada seção e se os números não correspondessem na nova cópia, o trabalho era rejeitado.
Além disso, existem nas Bíblias enormes coleções de notas massoréticas, tratando de assuntos tais como: contavam as palavras de um livro e assinalavam a palavra central, registravam o número de vezes que uma palavra ou frase específica ocorriam, faziam listas com palavras que apareciam uma, duas ou três vezes no Velho Testamento, anotavam as construções e formas já desusadas. Eles notaram, por exemplo, que a letra central da Lei se achava em Lev. 11:42, quanto aos salmos, a letra central está no salmo 80:4, o versículo central é o 36 do salmo 78.
Desde que o supremo alvo dos massoretas era transmitir o texto tão fielmente como o tinham recebido, não faziam nele nenhuma alteração. Onde presumiam que tinha havido algum erro de transcrição, ou onde uma palavra não estava mais em uso polido, colocavam a palavra certa ou preferível, na margem. Neste caso, a palavra correta ou preferida e que tencionavam que fosse lida, chamavam "Qerê" – o que deve ser lido, mas as suas vogais eram postas sob as consoantes da palavra no texto inviolável (esta era chamada de Kethibi = o escrito).
Deus é designado na Bíblia por vários nomes, o "iod", o "hê", o "vau", e novamente o "hê", conhecidas como Y H W H, algumas vezes também transliteradas em J H V H.
Como os judeus eram excessivamente respeitosos para com o nome da Divindade, para evitar que alguém o profanasse, pronunciando-o, usavam em seu lugar Adonai = o Senhor.
Os massoretas colocavam sob o tetragrama do texto hebraico consonantal as vogais a, o, â da palavra Adonai. Desde que este título era tão comum, pois aparece no Velho Testamento 6.823 vezes, os massoretas acharam desnecessários chamar a atenção para este "Qerê" = o que deve ser lido; recebendo até o nome de "Qerê Perpétuo".
Já no tempo da Reforma quando se incrementou o estudo das línguas bíblicas, ao lerem o Velho Testamento, por não compreenderem bem o problema de "Qerê e Kethibi" uniram as vogais da palavra Adonai com as consoantes do tetragrama, aparecendo a palavra hebraica Jeová, até aquele tempo inexistente. A pronúncia correta em português para este nome da Divindade deve ser Javé ou Jaweh.
Neste sentido podemos concluir que o aparato crítico introduzido pelos Massoretas é provavelmente o mais completo da sua espécie. Embora todo a trabalho massorético fosse útil e importante, entre eles o que mais se destaca e o mais conhecido foi a criação de um sistema de sinais vocálicos que introduziram no texto consonantal para a correta pronúncia das palavras, tornando-se talvez um trabalho único, além de ser a única garantia das Escrituras Sagradas chegarem até os dias de hoje. Portanto, todo mérito por esta grandiosa obra, que vem inspirando gerações e gerações por milênios, devemos ao valoroso trabalho dos Massoretas, fora um trabalho tão minucioso e tão respeitoso para com a palavra de Deu, que eles tiveram o cuidado de anotar toda e qualquer alteração feita por eles, como podemos observar:
1) A Massora Inicial – Um estudo da palavra inicial do livro, que sempre era usada como título para o livro.
2) A Massora Pequena – Eram os comentários que se encontravam nas margens laterais.
3) A Massora Grande – Comentários colocados nas partes posteriores e inferiores da página.
4) A Massora Final – como o nome indica, era posta no final do livro, contendo, especialmente, dados estatísticos para o copista, como número de letras e palavras daquele livro, a palavra medial, etc.
Apesar do trabalho dos massoretas ter sido bastante cuidadoso, acredita-se que nem todos os manuscritos foram copiados com tal esmero e exatidão, é possível que tenha ocorrido algum equivoco, em se tratando de um trabalho humano é perfeitamente aceitável. Em consequência nem todas as cópias sagradas do original são exatamente iguais, há muitas variações dos manuscritos, que dificultam bastante o trabalho dos tradutores. Apesar destas variações, o trabalho da Crítica Textual tem sido tão eficiente na reconstrução do original, que na essência o texto da Bíblia não sofreu nenhuma alteração.



Fontes consultadas:
Material apostilado do Professor, Giovanni Battista Tuveri
História do Texto Bíblico
A Bíblia Anotada - Mundo Cristão
Panorama do Antigo Testamento - Editora Vida

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