Vanilce Fiel

segunda-feira, 19 de março de 2012

RESUMO DA OBRA "AS FORMAS ELEMENTARES DA VIDA RELIGIOSA DE DURKHEIM - 1912"

Resumo da obra “As Formas elementares da Vida Religiosa” de Émile Durkheim – 1912, a partir da análise de Mirela Berger.

Por Vanilce Fiel

Segundo a autora que analisa a obra, o objetivo central de Durkheim é de elaborar uma teoria geral da religião, baseado nas análises das instituições religiosas mais simples e mais primitivas. Para Durkheim só é possível apreender a essência de um fenômeno social a partir da observação de suas formas mais elementares.

O Livro apresenta três grandes eixos de análise:

ü O primeiro consiste em descrever e analisar detalhadamente os sistemas de clãs e totemismo de certas tribos australianas;

ü O segundo consta de uma tentativa de compreender a natureza da religião e sua importância para a vida social;

ü E por último, apresenta passos iniciais da construção de uma teoria do conhecimento. Aqui Durkheim realiza uma interpretação sociológica das formas de pensamento humano.

v Descrição e análise detalhada do sistema de clãs e totemismo de certas tribos australianas.

No primeiro capitulo do livro, Durkheim já apresenta o problema que o inspira a escrever esta obra “estudar a religião mais primitiva e mais simples que se conheça atualmente, analisá-la e tentar explicá-la”.

Para Durkheim, um sistema religioso é o mais primitivo quando preenche duas condições:

ü Em primeiro, é preciso que se encontre em sociedade cuja organização não seja ultrapassada por nenhuma outra em simplicidade;

ü É preciso que seja possível explicá-la sem interferir nenhum elemento tomado de religião anterior.

O autor ressalta a importância do estudo sociológico não se limitar em apenas conhecer ou reconstruir as formas antigas de civilização, mas antes de tudo o trabalho do sociólogo consiste em explicar uma realidade atual, próxima de nós, com objetivo de atingir nossas ideias e nossos atos. O estudo deverá voltar-se para a realidade, o interesse em estudar o passado, pauta-se em conhecer bem o Homem de hoje.

A singularidade Durkheimiana apresenta-se por quatro pontos importantes que conheceremos agora:

ü O primeiro refere-se à necessidade de estudar a religião mais simples e primitiva que se conhece atualmente, como forma de compreender a essência da religião, além de ser capaz de identificar nas religiões mais avançadas, a exemplo do cristianismo, crenças e ritos muitas vezes emprestados de diversas religiões.

A importância de se estudar as religiões ditas “mais simples e primitivas” para Durkheim vai além de simples evolucionismo, trata-se simplesmente do fato de que, partindo do estudo de religiões mais simples do ponto de vista da sua organização é possível entender as necessidades básicas e gerais da humanidade que aparecem confusas nas religiões mais atuais.

ü Em segundo lugar Durkheim apresenta a importância em delimitar o campo específico da sociologia. Esta só passa a ser pensada como uma ciência social e positiva a partir do século XIX, por ser considerado o precursor da sociologia enquanto ciência, Durkheim irá empreender em seus estudos sociológicos, um objeto claramente definido e um método próprio para estudá-lo. Pra ele os objetos são os fatos sociais, o método é a experimentação e a observação indutiva, ou método comparativo.

ü Aqui ele defende que a ênfase da sociologia enquanto ciência positiva nos leva a dois outros pontos: primeiro ele se afasta dos evolucionistas, quando se propõe a olhar para “uma realidade próxima de nós (que é o Homem)”, mas o com o objetivo de conhecer o Homem hoje. Para Durkheim, o homem primitivo não deverá ser visto como objeto de análise, mas como instrumento para se conhecer uma realidade mais geral que é a religião.

Durkheim parte do princípio de que o estudo do primitivo servirá como um caminho metodológico para se chegar ao que verdadeiramente interessa para o sociólogo que é conhecer o papel da religião.

Talvez o ponto central da obra de Durkheim consista na compreensão da religião enquanto um aspecto “essencial e permanente da humanidade”. O mesmo acredita ser a religião uma característica geral da sociedade humana, estando na base da constituição do homem. Para o autor o importante não é conhecer esta ou aquela religião particular, o importante para ele é pesquisar o que vem a ser a religião em geral, buscando o que há de comum entre elas. É possível que na base de todos os sistemas de crenças e cultos haja um certo número de representações fundamentais e de atitudes rituais que, apesar da diversidade das formas que uma e outras puderam assumir, apresentam, por toda parte, o mesmo significado objetivo e também, por toda a parte, exerçam as mesmas funções. Estes são elementos permanentes que constituem o que existe de eterno e de humano na religião em geral.

ü Por último ele ressalta que esta noção de que existe um certo número de representações fundamentais próprias do pensamento e do comportamento humano vão orientar as críticas que ele dirige aos outros teóricos que se debruçaram sobre a religião.

Apesar dele não apresentar uma fundamentação sólida com relação às criticas aos pensadores que os antecederam, o próprio apresenta uma inovação ao pretender explicar de fato as religiões, e principalmente por fazê-lo calcado na eficácia simbólica e social destas crenças. Defende a ideia de que uma instituição humana não poderia repousar sobre o erro ou mentira. Para Durkheim ao realizar os estudos das religiões primitivas é imprescindível saber atingir a realidade que representa e que lhes dá a sua significação verdadeira. Mesmo os ritos ou mitos mais extravagantes ou até bárbaros, têm por objetivo traduzir alguma necessidade humana, algum aspecto da vida, quer individual ou social. Cabe aos cientistas a tarefa de descobrir as verdadeiras razões que justifiquem tais acontecimentos.

Durkheim afirma não haver religiões falsas. Todas são verdadeiras à sua maneira: todas respondem, ainda que de maneiras diferentes, a determinadas condições da vida humana. O fato de ter que se reportar às religiões primitivas não é com o intuito de depreciá-las, pelo contrário, a necessidade de reportar-se a elas como forma de resolver problemas atuais, reafirma sua importância.

Além da religião não ser um delírio, ela tem a função de nos ajudar a viver melhor. Para ele as religiões são obras da sociedade que a expressam, estando assim na base de qualquer pensamento, inclusive o científico, servindo como categorias fundamentais do pensamento e por conseguinte da ciência, bem como as regras da moral e do direito, nasceram das prescrições rituais. Neste sentido podemos afirmar segundo Durkheim, que a ideia da sociedade é a alma da religião.

Ao retomar o problema da origem das religiões, Durkheim ressalta que se por origem entendermos um primeiro começo absoluto, é claro que a questão nada tem de científico. Para ele não existe um momento radical em que a religião tenha começado a existir, e não há como nos transportarmos até lá pelo pensamento. Como toda instituição humana, a religião não começa em lugar algum. Portanto, o que interessa para o campo do conhecimento é encontrar um meio de discernir as causas, sempre presente de que dependem as formas mais essenciais do pensamento e da prática religiosa.

Durkheim ao contrário dos evolucionistas, que acreditam ser possível encontra entre os primitivos, que estariam num estágio inferior ao da civilização, a origem do fenômeno religioso, ele busca o que é fundamental, básico e permanente no conjunto das religiões, ele persegue a natureza do fenômeno religioso, natureza esta que possui razão, causa e funções específicas.

A autora da análise destaca de forma esquemática alguns pontos importantes que Durkheim enfatiza na primeira parte do texto dedicado ao “objeto da pesquisa”:

1) Necessidade de descobrir a essência da religião;

2) Delimitação do campo da sociologia em oposição à etnografia e a história;

3) Crítica ao evolucionismo;

4) Certeza de que se pode construir uma teoria geral da religião;

5) Ideia incipiente de estrutura;

6) Base para as discussões entre ação e representação;

v Tentativa de compreensão da natureza da religião e de sua importância para a vida social.

Aqui Durkheim irá enfatizar três pontos considerados cruciais:

ü A religião como aspecto constitutivo do espírito humano e existência de categorias básicas do entendimento que nasceram da religião;

ü Religião como coisa eminentemente social;

ü Polêmica entre o apriorismo e o empirismo e, principalmente, como teoria do conhecimento que Durkheim se propõe desenvolver pode unificar de forma satisfatória as duas correntes.

No pensamento Durkhemiano o fenômeno ultrapassa o circulo das ideias propriamente religiosas, ampliando o debate para um campo mais geral. Sabemos que os primeiros sistemas de representação empreendidos pela humanidade, sejam para explicar a si mesmo ou o mundo, são de origem religiosa. Portanto a religião é ao mesmo tempo uma cosmologia e uma especulação sobre o divino. Uma vez que a filosofia e as ciências nasceram da religião, em um dado momento a própria religião fazia às vezes das mesmas. Neste sentido Durkheim afirma que devemos a religião não só parte da matéria que formou o conhecimento, como também a forma pela qual esses conhecimentos foram elaborados.

Na visão do autor a religião não é apenas o reflexo de uma visão de mundo, e sim o elemento essencial desta apreensão, recorte e classificação do real. Ele nos chama atenção para fato de que o nosso pensamento tem como base certas categorias de entendimento sendo elas, as noções de espaço, tempo e de gênero que Aristóteles chamou de categorias do intelecto. São elas às propriedades mais essenciais das coisas, servindo como molduras sólidas que engastam o pensamento parecendo não poder desvencilhar-se delas sem se destruir; parece ser impossível pensar objetos que não estejam no espaço ou no tempo.

Podemos então concluir à luz de Durkheim que a Religião e eminentemente social, suas representações são coletivas e os ritos são maneiras de agir e que surgem unicamente no seio dos grupos reunidos e que se destinam a suscitar, a manter, ou até a refazer certos estados mentais destes grupos.

O que Durkheim quer nos mostrar, é que as categorias básicas de apreensão do real têm por base pontos de referências que não são produzidos individualmente, pelo contrário, são sociais e coletivos. A organização de espaço e tempo são reflexos e produtos da organização da sociedade, visto que, só é possível pensar as categorias de espaço e tempo porque as sociedades existem, do mais nada mais é do que classificações sociais.

A divergência entre o evolucionismo e o pensamento Durkhiemiano funda-se na seguinte questão: os evolucionistas focam mais na magia, considerada individual, enquanto que para Durkheim a religião está associada à ideia de igreja, mais coletiva. Para ele a religião é coletiva porque a crença é coletiva, e assim ele chama a atenção para as dimensões sócias do fenômeno religioso.

Um dado importante no pensamento de Durkheim é fato deste perceber a religião como um sistema, um todo formado por partes. Ao partir desta ideia ele irá estabelecer a relação entre a crença e o rito.

Ele compreende que o fenômeno religioso ordena-se naturalmente entre duas categorias fundamentais: as crenças e os ritos. As primeiras são estados da opinião e consistem em representações; e os segundo, são modos de ação determinados.

Segundo Mirela Berger, neste ponto há um problema que o autor não resolveu. Num certo momento ele afirma que só se pode definir o rito pela crença. No entanto nesta obra ele explica a crença pelo rito, e afirma que a experiência religiosa só pode nascer pelo rito.

Quando o autor trata a religião enquanto sistema, este prende a religião à outra ideia fundamental, a ideia de que as crenças religiosas requerem um sistema classificatório que levará à distinção do sagrado e do profano estabelecendo dois mundos que não podem se encontrar.

Tendo, pois definido o que é religião de modo geral, o autor irá analisar a religião mais elementar, que para ele é o totemismo.

Ao tentar definir o que é o totemismo, ele tentará confirmar as hipóteses por dados e teorias. Na tentativa de confirmar as hipóteses, ele irá procurar no totemismo os elementos que considera básico na religião concentrado-se nas crenças e na distinção entre sagrado e profano.

Em seus estudos ele irá chegar à confirmação de que a religião totêmica está presa a organização social. Por isso a importância do nome clã. E descobre que no totemismo o importante não é o homem, o animal ou a planta, mas a representação deles num objeto diferente deles. O que o leva a entender que se o australiano é tão fortemente inclinado a figurar e seu totem, não é para ter sobre os seus olhos um retrato que se renove perpetuamente a sua sensação; mas é simplesmente porque sente a necessidade de representar tal ideia por meio de um sistema material, exterior, seja qual for o sinal. Neste sentido é possível afirmar ser o totem uma representação, ou seja, a manifestação material de uma imagem mental.

No entanto no que tange a explicação do porque estas plantas e/ou estes animais, só Lévi-Strauss é capaz de explicar isto, através das estruturas mentias inconscientes. Ele começa a explicação retomando a ideia de mana, enquanto força sagrada que se deposita em homens, palavras e plantas.

Portanto um totem nada mais é do que a força material sobre a qual se representam para a imaginação. O universo totêmico é animado por um certo número de forças que a imaginação representa sob a forma de princípios tomada de empréstimo, do reino animal e vegetal. Eles encontram-se em número de acordo com o número de clãs das tribos e cada uma circula através de determinadas categorias de coisas das quais consistem a essência e o princípio vital.

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